quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Xuxu com Camarão

  
                   XUXU COM CAMARÃO
     Ontem comi xuxu com camarão. Estava ótimo. Depois, em plena siesta, deitado na rede, percebi que o legume é um lapso. Noventa e oito por cento do xuxu que degustei é água! Fui traído; bebi o almoço.
     O prolapso da língua, sua queda, é mais evidente nos pronunciamentos políticos do que nas rezas religiosas. Há um desvio na anemia verbal de uma Senadora da República, pode ser uma Jacqueline ou uma Roriz, não importa o nome, e o princípio da Verdade é abortado quando suas palavras ofendem nossos tímpanos: escutamos o ruído do ar, onomatopaico, e não o sentido melódico dos fonemas e dos semantemas. O vento do Verbo, nos políticos, nos causa tormento e o suplício, quando tentamos dar sentido as suas falas, emana do nosso sentimento de estarmos sendo traídos. Elas se expressam como os xuxus; parecem sólidos.
     A retórica política, sua habilidade, nos leva a uma idéia de destino. Não o nosso, mas induz ao final de uma ação, a deles, que proscreve o mal e prescreve o bem, ainda o deles, dizendo representar-nos. Está suposto que os nódulos de uma linguagem podem ser cancerígenos, e, se a água areada impregna um verbo, a metástase é inevitável e a violência não é “natural”. Paixão e tortura podem fazer ato oficial e assinado. É preciso, então, voltar ao Homem, e deixar o xuxu parlamentar fazer o seu papel.
     O pseudônimo, como um dos nomes possíveis, é revitalizado levando-nos a comer gato por lebre. Questão de imperícia de quem faz mal o que faz ao não escutar a gramática de um legume mentiroso. O risco de adoecer sem a proteína do enunciado é evidente; o camarão, aí, tem o seu papel mesmo quando nos damos conta de que o referido crustácio tem políticos na cabeça.
     O que nasce deste discurso inanimado é um lugar, vazio, marcando o fim da autoridade e o nascimento de uma dejeção; resto dessignificado e verdade estuprada. O nada humano ou o inumano do aquém do Ser e do espírito são pronunciados com o sotaque de letras mortas, desmaterializadas. Alguem necessita de um político para viver? A côrte brasiliense é necessária ou contingente?
      Nos anos quarenta, in USA, mais de mil prisioneiros – doentes mentais, prostitutas e até crianças – foram infecados deliberadamente com gonorréia e sífilis “para testar as propaladas vantagens da recém-descoberta penicilina” (O Globo, 31/08/2011). In God we trust: no jornal O Gobo já citado lemos que durante quarenta anos cidadãos americanos “infectados com sífilis foram acompanhados pelos médicos – que queriam entender o desenvolvimento da doença – sem receber nenhum tratamento. Pior, eles acreditavam que estavam sendo tratatos pelos cientistas...”.
     Freud (O Mal Estar na Civilização): “Sob circunstâncias propícias, quando estão ausentes as forças anímicas contrárias que as inibem, a agressão cruel se exterioriza também espontaneamente, desmascara os seres humanos como bestas selvagens que nem sequer respeitam os membros de sua própria espécie...Em consequência, o próximo não é somente um possível auxiliar e objeto sexual, mas uma tentação para satisfazer nele uma agressão, explorar sua força de trabalho sem ressarci-lo, usá-lo sexualmente sem seu consentimento, despojá-lo de seu patrimônio, humilhá-lo, infligir-lhe dores, martirizá-lo e assassiná-lo”.
     Somos ou não somos, todos nós, cobaias humanas nas mãos de nossos Soberanos? A bioética do Estado, lá a aqui, em nome de Deus, manipula heróicamente seu próprio ambiente; há meio século a autoridade constituida se especializou em patinar na laminha de seus próprios gonococus. A ciência jamais inventará qualquer vacina para nos proteger dos perdigôtos de um deputado, federal ou estadual.
     Em nosso Congresso Nacional o xuxu gonorrêico, pestilento, anda em alta. Aquilo há muito tempo já virou nosso Museu do Sexo e a promiscuidade corporativista de nossos governantes jamais saberá diferenciar um lapso leguminoso da purulenta infecção cerebral que os assola. Para eles, a cura ainda está longe, o prognóstico é sombrio e nenhum fotoshop de última geração pode disfarçar seu defeituosos sistemas nervosos centrais: eles já nasceram sem neurotransmissores.
 
Foto: a Senadora Jacquelin Moniz (à direita) cuida de seus eleitores e monitoriza suas chances de reeleição.

Um comentário:

  1. Blog do Dr. Mario Jorge?? Parece o Sócrates! O jogador, não o filósofo.

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